O VELHO PALCO DO NOVO MUNDO
Andressa Schröder
Em meio a padrões barrocos e reflexos dos valores do Romantismo, Débora Steinhaus nos instiga a repensar as relações do homem com a natureza sob o viés de novas perspectivas. Débora é uma artista brasileira que traz em seu trabalho a profunda ligação de suas experiências pessoais e profissionais com a História, Cultura e Ecologia. Suas pinturas têm fortes laços com técnicas de desenho, composição cenográfica e uma intensa pesquisa da cor.
O Velho Palco do Novo Mundo apresenta obras compostas de elementos naturais e fantásticos e de uma nostalgia romântica, com os quais a artista brinca para desvendar importantes características da valorização e dominação da cultura sobre a natureza. Steinhaus nos convida a subverter estes valores e repensar os parâmetros da cultura brasileira, historicamente subordinada a uma idealização européia. Sua narrativa evidencia os resultados de uma simbiose cultural que nos permite reinterpretar a complexidade das interligações entre cultura (dominante e dominada) com a natureza. Neste sentido, Débora explora nuances do romantismo europeu, mais precisamente o alemão, e as conecta, quase como numa brincadeira, com uma perspectiva contemporânea sobre a cultura brasileira. Neste confronto, destacam-se importantes temas que remetem a atuais debates sobre a proteção da diversidade cultural e ambiental.
Uma das características mais marcantes do trabalho de Débora Steinhaus é o uso da cor. Cores fortes e vibrantes são meticulosamente trabalhadas em contraste com suas complementares, fazendo dessas realidades, mistas e simbólicas, algo vivo e latente ao olhar. O trabalho com a cor, que se desenvolve de forma processual e intensa, se dá em conjunto com os detalhes das ricas composições, através de técnicas que a artista desenvolveu após longa experiência com o trabalho em cenografia. O Velho Palco do Novo Mundo envolve, neste sentido, dimensões históricas, culturais e experiências pessoais da artista, que conecta todas as diferentes facetas de seu trabalho de forma harmoniosa, mas ao mesmo tempo extremamente marcante.
Através deste olhar romântico sobre a contemporaneidade, Débora investiga as possibilidades da percepção estética sobre a natureza. Tal percepção não se dá apenas de forma distanciada, como indicam certas teorias estéticas. Steinhaus nos revela que a percepção estética da natureza pode ser algo que se desenvolve juntamente com as transformações culturais, gerando consequentemente, diferentes relações entre o homem e o seu ambiente. Através de tal sensibilidade, a artista torna esteticamente relevantes os recorrentes problemas existenciais que assolam a ecologia mental e cultural e que estão intrinsecamente ligados à ecologia ambiental. Muito além da reflexão sobre a representação figurativa presente em seu trabalho, o espectador é convidado a reinterpretar o seu próprio contato com o seu meio ambiente, através de sua experiência e sua imaginação. No refúgio da natureza, bruscamente apartada da racionalidade humana, é que se torna possível reencontrar os laços que em algum momento faziam da cultura algo natural. Neste sentido, a cultura brasileira carrega a forte presença do seu desenvolvimento em meio a uma rica biodiversidade, que é ao mesmo tempo politicamente suprimida em prol de fortes interesses econômicos.
Na trama que se desenrola em O Velho Palco do Novo Mundo, partindo da obra Museum, Steinhaus desenvolve diversos cenários explorando diferentes peculiaridades, como por exemplo, a fascinação perante a natureza e a curiosidade científica do homem em relação ao meio ambiente. Para além do romantismo e de uma visão melancólica sobre a natureza, Débora desvela de uma forma extremamente poética, temas contemporâneos em meio a sedução e ao simbolismo presentes em suas telas. O ápice desta trama se dá com a imponente obra Vitória Régia. Os minuciosos detalhes desta composição despertam a imaginação do espectador e revelam a instigante narrativa e envolvente percepção estética proporcionadas pela artista. Débora Steinhaus nos traz neste enredo obras com um conteúdo extremamente atual e político, mas apresentados através de uma suavidade estética que torna o seu trabalho distinto e encantador.