ENCONTROS E INTERVALOS (DESLOCAMENTOS)

Parcerias entre a matéria e a imaginação produzem a expressão (o resultado) visual das particularidades que me propõe cada trabalho imaginado e finalizado.

As cores e as formas elaboradas, sejam sobre o papel, seja na argila modelada, buscam dar identidade plástica a cada escolha. Ao conferir o conjunto de meus trabalhos gosto de perceber as alternativas diversas produzidas através de seus componentes formais, técnicos, emocionais, objetivos e subjetivos, utilizados no momento da realização de cada objeto. Minha proposta como autor busca se concretizar num exercício de acúmulo. Tenho como alvo articular elementos que provoquem proximidades e distanciamentos. São encontros e intervalos entre as possibilidades significadas. Isso pode acontecer, tanto em cada trabalho, quanto no somatório de trabalhos.

A modelagem e queima do barro é uma técnica milenar que acompanha a humanidade. O barro me atrai por ser um material inicial, simples e maleável, repleto de possibilidades; me aproxima da natureza e do primitivo e se adapta às singularidades de seu tempo e finalidade.

Em meus ensaios, as linhas e planos praticados na argila encontram paralelos nas linhas e planos induzidos pela percepção óptica das formas sobre o papel tingido pelas cores. Quando se busca promover uma imagem na construção de uma linguagem plástica, tanto a escultura quanto a pintura se alimentam da luz e da sombra, reais ou pressentidas, no preenchimento das formas. Busco exercitar e entender esses diálogos que se estabelecem sob a nossa perspectiva de mundo imaginado que nos foi proporcionada pelo mundo real; no mundo real a percepção de formas e harmonias se dá pelo entendimento intuitivo contido nos limites de nossa visão humana; o reconhecimento de regras apreendidas da própria realidade que nos cerca e que nos deu limites e exemplos na construção de uma civilização. Aceitar, negar, conflitar, ritmar essas regras contingentes são escolhas que ampliam nossos conceitos e desenvolvem nosso contato e consciência com as coisas e consequentemente com a vida interior e exterior.

Constituir formas me proporciona conhecer os mecanismos que estão por trás dos efeitos visuais que desencadeiam resultados significantes. Sinto falta no mundo de hoje de uma integração das ideias com o que nos cerca e como isso nos toca e nos percebe. Esses exercícios de adequação da percepção me atraem e são o argumento do meu fazer. Deslocar meu interesse entre a pintura e a escultura, o figurativo e a abstração, me permite um intercâmbio entre elementos plásticos e significados. Provocar encontros e distanciamentos produz intervalos que me seduzem, ao percorrer minhas dúvidas e expectativas visando transportá-las para a matéria ao embriagá-la de estímulos intermináveis.

Luiz Felkl [Novembro, 2022]