FELIX BRESSAN

Paula Ramos [crítica de arte, professora e pesquisadora do Instituto de Artes da UFRGS, Universidade Federal do Rio Grande do Sul; texto de apresentação do artista para o livro 3×4 VIS(I)TA]

Escultor, cenógrafo e professor, Felix Bressan (Caxias do Sul, RS, 1964) explora em parte significativa de seu trabalho as relações de estranhamento, tendo como eixo o corpo e as proporções humanas. Herdeiro de certa tradição duchampiana, o artista apropria-se de objetos industrializados e opera sua desmontagem e sua reconstituição, inserindo elementos e propondo, com isso, inusitadas relações. Artefatos do cotidiano, como bancos, cadeiras, vassouras, talheres, máquinas de escrever, passando por ferramentas como ancinhos, foices, pás e chegando a louças sanitárias como pias e bidês para banheiro: haveria limites? A mesma abundância se verifica nas técnicas empregadas: encaixe, dobra, fundição, modelagem com resina de poliéster e, mais recentemente, impressão 3D. É na sequência de decomposição, deformação e recomposição que o artista gera seus objetos transfigurados, potentes em formas e significados.

Calcadas majoritariamente em produtos industrializados, suas esculturas poderiam ecoar certa impessoalidade e distanciamento. Todavia, os liames com o corpo humano, matriz de sua poética, não o permitem. Durante sua juventude, Felix trabalhou na escola de modelagem industrial Eltobres, que a família mantinha em Caxias do Sul. Ali aprendeu, entre outros ofícios, a observar, medir e representar as formas femininas. Sua série Corpo ausente, iniciada durante o Mestrado em Poéticas Visuais junto ao Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da UFRGS, nos anos 1990, evidencia essa gênese. Em proporções humanas e exibidas de modo a confrontar o espectador, sugerindo um desconfortável uso, as esculturas remetem a corpos de mulheres, porém não devido à representação do corpo em si, mas pelo que lhes envolve, a indumentária. Há, portanto, uma dualidade entre o que se vê e o que se imagina, entre o vazio e o cheio. A alusão a espartilhos e a saias de armação, empregados para delinear, mas também para tolir e aprisionar os movimentos, reforça o caráter de submissão, fetiche e dor imposta, recorrente na produção do artista.

Pesquisador de técnicas e materiais, Felix Bressan trabalha com o desmonte de objetos, mas também insere couro, madeira, látex, plástico, borracha, ferro, resina, parafusos, mesclando procedimentos, consistências e texturas. Suspensas, projetando-se a partir das paredes ou do chão, suas esculturas podem ser leves ou pesadas, flexíveis ou rígidas, mas são atravessadas, sempre, por um admirável equilíbrio e por uma dinâmica tanto de base estrutural, como sugerida pelas formas, que se encaixam, sobrepõem e espelham, criando um singular ritmo visual. Tais aspectos, aliados à cadência, à força e às conotações suscitadas por suas obras, fazem do contato com as mesmas uma experiência, se não transformadora, no mínimo inquietante.